sexta-feira, 15 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(7)


( o Padre Joaquim da Barca:)

… confesso, com sinceridade, que me tem tristemente impressionado a prosa romarieira do meu grande amigo o sr. padre António de Xisto, na controvérsia que originou , sem nenhum motivo ponderoso, com a sua cartinha de 17-8-930, inserta no nº 18 deste amicíssimo jornalzinho, e que tenho lamentado, muitas vezes, a sós comigo, a pobreza franciscana da sua argumentação.
Casa da Barca, Vila das Aves
                Não tenho sentido pequeno pesar em ver o seu nome a subscrever artigos em estilo de esfolhada, capazes de despertar riso em ignorantes, mas absolutamente impotentes para convencer uma inteligência, mesmo modestamente esclarecida.
                Um assunto sério, meu caro senhor, trata-se em linguagem séria e com argumentos sérios.
                As facécias, os motejos, as chacotas, as zombarias e os remoques são geralmente, contraproducentes. (…) Deixe-me falar-lhe, sr. padre Brandão, com o coração nas mãos: eu esperava mais e melhor da sua pena. Não me tome a mal esta rude franqueza.
                (…) Se não vier coisa de maior tomo, desde já posso cantar vitória, não lhe valendo de nada ter chamado à baila o D. Quixote – a imortal criação de Cervantes,  infalível recurso de todos os arsenais mal apetrechados  para as refertas do espírito, já mais poída que as botas de um almocreve. Nem originalidade, nem novidade, nem sequer ajustada aplicação.
                E depois também não foi nenhuma a sua  ventura na escolha do matiz para os seus artiguinhos ou artigões…
                Ora veja lá, sr. padre António Maria Monteiro Brandão, se são digno esmalte da sua prosa as palavras: taberna, meios litros, ramos de loureiro , paus de ferro, cacetes, machos – e de penas –fêmeas, galinheiros e galinhas, capoeiras e galos, bicharocos, bacamartes, saias curtas, cambaleando, turras, manhoso, gaiolas e outras miudezas.
                (… )  E como se há-de classificar a ousadia de chamar ridículo ao nome Aves, só porque se lembrou de disparatadamente o comparar a galos e galinhas ou disso o derivar?
                (…)  E que se há de dizer da afirmação piramidal de deixar de ser nossa a estação, pelo facto do terreno em que se encontra ser comprado pela Companhia?
                É claro que ela é de todo o mundo para uso, mas enquanto à localização é só nossa, é só das Aves, meu reverendíssimo e diletíssimo confrade, nunca podendo dizer os de Negrelos, com verdade, que a sua freguesia tem estação dentro dos limites.
                 Quem precisa de fazer uma nova estação não é S. Miguel das Aves, que já tem uma –e ainda há de ter outra, se Deus quiser; quem carece de edificar uma, ao  menos, é S. Tomé de Negrelos, que não tem nenhuma, nem de cortiça nem de papelão.
                (…) Também há de permitir que eu  mais uma vez  lhe diga que do meio das pontes que nos unem, para a banda de cá, mandamos nós e só nós.
                Fique isto sabido duma vez para sempre. Intrusões, nunca!
                (…) E o sr. padre Brandão, meu amigo íntimo, de muitos anos, querendo, no que me dá muita satisfação, convidar-me para as afamadas sarrabulhadas do solar rico de Quintão, escreva para este seu criado, que na Barca, que já se desencalhou do Vizela e que põe ao seu dispor, para um passeio até ao Fojo, aguarda as suas estimadas ordens, prometendo jejuar na véspera das jantaradas, para gáudio da  cozinheira  e do patrão. Ah, meu boníssimo reverendo, se tivesse lido com serenidade e sem pruridos de literato filósofo os meus artiguitos sobre a palavra “Negrelos”, daqui das Aves, não se teria arvorado em D. Magriço da sua terra, cuja honra ninguém poluiu nem seque tentou poluir.

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