(a prosa do Padre António, continuação…)
Já que entrei nos domínios da filosofia, apesar de não ter a elegância demosténica, filosoficamente lhe vou demonstrar que se na Estação se inscrevesse a palavra Aves o colega seria o primeiro a arrepender-se e não haveria chefe que fizesse o serviço.
Para isso vou estabelecer as
premissas. A primeira será tirada da filosofia Tomista, e o restante da
filosofia Jocosiana. Jocoso, como sabe, é um filósofo de fama mundial. A sua
monumental filosofia entra em todas as Universidades científicas. Nas Academias,
Liceus, Colégios e Seminários é muito manuseada.(…)
Se na estação se eliminasse a
palavra Negrelos e fosse substituída pelo
irrisório Aves, a rapaziada, lendo
este nome, munia-se de fisgas e logo que visse o Chefe à janela com os vivos
amarelos no barrete, supondo que era um canário ou um papa-figos – zás – uma fisgadela na testa do chefe, e ficava morto. E caso não
morresse e estonteado fugisse , a rapaziada subia à janela para caçar o
passarinho; entrava e era presa pela autoridade, como bando de gatunos e
assassinos.
Em visto do exposto não havia
chefe que quisesse fazer os serviço, a não ser um descrente ou um louco, mas
isso não convinha e, portanto, o colega Padre Lemos dizia: “ mude-se outra vez
o nome, Negrelos é que deve ser e não Aves”.
Tornava a estação a chamar-se de
Negrelos e não das Aves: damos de barato que o amigo Padre Lemos não se dava
por vencido com este argumento autenticamente Jocosiano.
Se esta demonstração o não
convence, como nos há de convencer a sua
reles demonstração de que Negrelos vem de ager
e de niger?
Negrelos decomposto não descende
de tais bicharocos nem de ager e niger. Isso é uma invenção sua ou de
algum nefelibata, muito inferior à minha Jocosiana, que é mais provativa; e não
repugna acontecer o que por sua
argumentação se pretende demonstrar.
Niger e ager são Aves glicónicas
que não arribam a Negrelos, e alimentam-se nos arrozais da sua fértil e mimosíssima
freguesia.
(…) O amigo Padre Lemos ao ver a palavra Negrelos
na estação fica desnorteado, arrepiam-se-lhe os cabelos, crispam-se-lhe as mãos
e com os nervos em contínua vibração,
puxa do florete e investe contra o seu inimigo Negrelos, como o camponês contra
os paus de ferro e o D. Quixote contra o moinho de vento.
O seu amor apaixonado pelas Aves
queridas ofusca-lhe o espírito e faz-lhe ver preto o que é branco e bonito o
que é feio. (….) o amor é um binóculo
prismático que deforma a verdade.
É por isso q eu num artigo o meu
amigo escreve : o Negrelos da minha embirra é o das estações férrea e do
telégrafo postal; noutra parte finge
não saber o que Negrelos é e noutro artigo dá-lhe personalidade jurídica responsável,
porquanto chama-lhe usurpador, e ser
preciso bani-lo e fazê-lo passar o Avizela. Apelida-o de feio e estrangeiro
, e noutro eleva a adjectivação ao superlativo, e denomina-o de estrangeiríssimo. Para fundamentar a sua
proposição argumenta: que não nasceu nas
Aves, nem está registado no civil nem no religioso.
O meu amigo falta à verdae duas
vezes só neste período; porquanto nasceu aí na estação que
Impropriamente pretende
cognominar das Aves e está registado oficialmente
como passo a demonstrar.
O Negrelos a que se refere não é
estrangeiro porque nasceu na estação apenas
ela chegou à idade e hora própria de ser mãe, viveu sempre em sua
companhia, foi baptizada por quem de
direito e, agora que tem maior idade e
fez as bodas de ouro, jamais a largará.
Além disso não é estrangeiro
porque só se chama e é estrangeiro o território, idioma, pessoas ou coisas de
Pátria diversa.
Ora Negrelos é do nosso pátrio
Minho, da nossa linda e poética região(…)
Está registado oficialmente nos
livros do chefe da Estação e em muitos cartões, cartazes e anuários
ferroviários.(…)
Mudar o nome nesta altura seria um disparate incompreensível, um
verdadeiro absurdo e faria um transtorno enorme. Isto é tão intuitivo que
não carece de demonstração.
Se os das Aves querem uma Estação
com o nome da sua freguesia que façam uma nova em terreno que lhe pertença e não no terreno que agora não é seu, porque
o venderam
à Sociedade Soares Veloso em Comandita. A estação que aí está é tanto sua como minha, pertence tanto às Aves como aos de Negrelos, Rebordões, Roriz, Monte Córdova, etc (…)
à Sociedade Soares Veloso em Comandita. A estação que aí está é tanto sua como minha, pertence tanto às Aves como aos de Negrelos, Rebordões, Roriz, Monte Córdova, etc (…)
Os de S. Tomé não reconhecem aos
de S. Miguel o direito de lhe imporem o nome despropositado de Aves e
gloriam-se de ver e ler na estação o histórico e fidalgo – Negrelos.
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