domingo, 30 de dezembro de 2012

Há 50 anos foi assim… (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local ) (6)



15 – O nosso clube ganhou em casa ao Serzedo com certa dificuldade. Houve uma quebra de rendimento devido ao facto do nosso grupo ter jogado todo o jogo praticamente com dez elementos. “Estará o nosso clube necessitado de utilizar jogadores em inferioridade física? Podemos afirmar que não. Então porque se fez alinhar Armando Almeida naquelas condições? Será por ter marcado dois golos na Lixa ou até porque fez uma boa exibição? E se na semana seguinte a uma boa exibição ele ou outro qualquer partir uma perna, no domingo seguinte irá para o campo jogar de muletas?”

16 – Os juniores fizeram um jogo agradável contra o Tirsense mas depois “recuaram até eles mesmos”. A utilização indiscriminada da bancada nesse jogo deu origem a uma iniciativa da direcção para garantir que a bancada seja para os sócios que a ela tenham direito. Outro aspecto, dizia o cronista, é o de estar sentados, porque estar de pé prejudica a visibilidade dos que estão sentados. “Se o assento está frio, ou húmido, aluguem uma almofada, que o Clube tem lá muitas para esse fim e, se não querem gastar os dez tostões, tragam uma de casa, que também não é proibido.”

17 – O resultado do jogo contra o Valonguense (4-1, a nosso favor) foi bom. Mas a expulsão do Dieste e os desacatos que levaram à interdição do campo eram dispensáveis. E, no jogo seguinte, a equipa, que ainda só tinha sofrido três golos, foi perder a Ermesinde por 5-1. Uma desilusão: “um guarda redes muito batido, uma defesa sem segurança e a oferecer brindes, uma linha avançada toda desligada…”

18 – O cronista do Jornal das Aves, que temos seguido de perto para escrever estes textos, a certa altura do início da época desabafava: “…tivemos um clube grande na mão dos grandes e agora temos um clube pequeno na mão dos pequenos (…).É que, salvo honrosíssimas excepções esses senhores até deixaram de ser vistos no campo e na sede. Como há-de o nosso clube progredir?”.
A escolha da direcção, no início do Verão, não tinha sido fácil mas provou que um clube pode progredir mesmo que os “grandes” não apareçam.
 Era assim o elenco directivo de 1962/63: Serafim Rodrigues , presidente; José Ferreira Dias, vice-presidente; Abílio de Oliveira e José Xavier Coelho, secretários; Luís Gomes Magalhães e António Oliveira Marques Pinto, tesoureiros; Ernesto Correia de Sá e Joaquim Gomes de Sousa Nogueira, vogais.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Há 50 anos foi assim... (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local)(5)


12 – Já o Novembro ia longe e ainda o campeonato dava os primeiros passos… Parece mesmo que  ainda não estaria definitivamente fechado o plantel, como se diz agora. Isto porque o cronista, para além de criticar a aquisição do guarda-redes, referia o atleta Pilú, regressado da Índia, onde cumprira serviço militar e estivera preso na sequência da invasão do território pelas tropas de Nheru: “chegou a convencer-nos de que poderia ocupar qualquer lugar dentro da equipa”, mas “ os senhores grandes da nossa terra deixaram de se interessar pelo clube e já nem sequer facilitam nada aos atletas”. Sabe-se lá se não terá sido o trauma de guerra a impedir uma grande carreira futebolística. No livro, publicado muitos anos mais tarde, sobre a sua vivência naquele território, Luís Pinto, o Pilú, realçou bem a importância do Desportivo das Aves nos seus anos de juventude e diz, a certo ponto, sobre o Toninho Pepino: “este homem nunca mais o esqueço porque enquanto prestava serviço militar normal na Índia, sempre fez o favor de me escrever e contar como ia decorrendo a vida do nosso Clube Desportivo das Aves”.

13 – A secção de Ciclismo festejou o 1º aniversário e expôs os troféus da época: “é uma secção que não pode acabar, mesmo que custe muito sangue, suor e lágrimas”.

No foto (a partir da esquerda): Machado, Fernando Adães, António Machado (treinador), Luís Machado, Manuel Jorge, Manuel Oliveira, Noé Azevedo, Ventura (massagista), David Adães e Certo.
14 – No que diz respeito aos resultados, “o nosso clube não conseguiu passar na deslocação a Amarante. Já o esperávamos”. Mas, na Lixa, a sorte foi outra e se as esperanças de ganhar se baseavam no Zé Pereira e no Dieste, que já podiam jogar, quem acabou por ser  o herói do jogo foi o Armando Almeida… O Desportivo ganhou por três a dois, com dois golos do referido atleta, que veio a ser presidente do clube com enormes sucessos desportivos. Ficamos, pois, esclarecidos, sobre as origens da extremada paixão do Presidente Honorário pelo Aves pelo seu clube: ele também teve tardes de glória com a camisola rubro-branca!


sábado, 22 de dezembro de 2012

Boas Festas...

Boas Festas!

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Há 50 anos foi assim… (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local) (4)


  (Publicado no jornal Entre Margens)

9 – A data do Jornal das Aves é 3 de Novembro de 1962 e a crónica diz: “começou, finalmente, no passado domingo, o campeonato distrital da 2ª divisão. O nosso clube recebeu o Castelo, a quem venceu por três bolas a duas. Não se pode dizer que o jogo tenha sido tão difícil como se pode depreender do resultado. Mas também não se jogou bem. Dominou-se bastante e só nisso estará o mérito da nossa vitória. De futebol limpo, apenas esteve em campo o nosso desejo. (…) Ganhou-se o primeiro jogo do campeonato, coisa que já há algumas épocas não se verificava. Talvez isso seja bom prenúncio.”
   “Impressionou-nos a forma como apareceu o Miranda, depois de tanto tempo parado. Quase todos os ataques nasceram dos seus pés”, dizia o cronista, que noutro texto questionava a ausência do Loureiro, alegadamente porque a direcção “não lhe pagava a noite de sábado para domingo, que ele não podia trabalhar para poder jogar”. A versão da direcção era de que só havia feito dois ou três treinos e que por isso nem sequer era convocado.

10 – O segundo jogo, oito dias passados, foi uma derrota: Cruz 2- Aves 0. O cronista demonstra preocupação porque derrotas como esta serão consequência da fragilidade da nossa equipa: “resta-nos, para já, uma equipa bastante esfrangalhada”, receando que alguém que venha ainda para compor a equipa “já não venha a tempo de salvar o barco que começou a meter água”.
Na foto: Soares dos Reis, Fernando, Carvalho, Mocho, José Maria, Neira, Lucas e Leandro (massagista); Miranda, Dieste (treinador), Soeiro, José Pereira e Loureiro.

11 – Um jornal diário anuncia por estes dias que o Desportivo das Aves acaba de fechar contrato com Soares dos Reis, que na época passada actuou no Futebol Clube do Porto, a guarda-redes. “É possível que o novo reforço do Aves possa alinhar já amanhã contra o Amarante, resolvendo assim as dificuldades criadas pela reprovação do titular Barros no Centro de Medicina Desportiva”. Outro jornal refere que os quadros do Clube estavam enfraquecidos pela saída de alguns para o futebol corporativo.

12 – Como é que um guarda-redes do Futebol Clube do Porto se muda para um clube da 2ª regional, depois de ter estado, ao que parece, pronto a assinar pelo Académico de Viseu? O que é que faz com que um jovem citadino venha viver na Pensão Alicate, no lugar da Ponte, Negrelos, para jogar no Desportivo das Aves? Ao que parece, havia relações de amizade e de negócios entre os presidentes dos dois clubes que facilitaram a transferência. E depois, o atleta encontrou por cá, por esses dias, a alma-gémea que o amarrou a esta terra e lhe proporcionou um contrato para a vida e que por cá o mantém, depois de uma carreira de futebolista profissional em vários sítios e de emigrante e desportista que continua a ser. Ou não fosse ele, hoje, um dos “Ases do Pedal”.  


domingo, 25 de novembro de 2012

Há 50 anos foi assim… (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local) (3)


  (Publicado no jornal Entre Margens)

6 – Lá se realizou o sorteio mas não há meio de começar o campeonato, cujo início foi outra vez adiado. Só em 28 de Outubro começará, finalmente, a bola a saltar!
O campeonato de juniores já rola e o Tirsense, após uma derrota por falta de comparência, defrontou o seu velho rival com apenas com nove elementos por não ter mais disponíveis. E mesmo assim, levou de vencida o Desportivo por duas bolas a uma! Bolas!


7 - Dieste, o treinador-jogador apresentado como a única aquisição para a nova época, em entrevista ao Jornal das Aves, declarou: “estou convencido de que temos uma das melhores equipas da nossa divisão”. E disse mais: “sinto-me bem, como em família. Devo no entanto dizer que já vinha a contar que assim fosse, pois que jogadores e treinadores que por cá têm passado me tinham dito que o ambiente aqui era sempre dos melhores.” Há 10 anos em Portugal, o nosso treinador tinha representado antes o Tirsense, o Porto, o Espinho, o Feirense e o Arrifanense.

8 - Ainda se discute o caso do Zé Pereira. Parece ter havido acordo para a cedência do atleta por três épocas por trinta e cinco contos e um jogo no nosso campo, mas depois disso o Salgueiros nunca mais apareceu mas o atleta continuou a treinar lá. O cronista do Jornal das Aves desespera por saber com quem podemos contar e, relativamente ao caso do Costa, pretendido pelo Vizela, diz que se entrou numa fase cómico-dramática, acusando o clube interessado de “utilizar os mais variados truques para ganhar um jogo que a nossa direcção pôs claramente na mesa”. O mês de Outubro está quase no fim e aproxima-se o início da época. Saberemos, não tarda, que, afinal, o Zé Pereira fica e o Costa ruma a Vizela…


quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Há 50 anos foi assim… (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local) (2)


(Publicado no jornal Entre Margens)



3  – “Os verdadeiros sócios do Clube são os que pagam sempre as suas cotas nas horas boas e más, que estão presentes na sede e no campo, que riem e choram com o riso e choro do  Clube, que se sacrificam pela sua existência, que vão às Assembleias, não para lavar roupa suja, passe o termo, mas para falar com o coração a sentir os interesses do Clube e os olhos postos na sua continuidade”. Era a sim que falava o cronista, num escrito intitulado “Factos e Conciderações”. O início do campeonato tardava e aproveitou-se o atraso no arranque dos jogos oficiais para realizar a festa do jogador Loureiro: “realmente, quem já dá há dezassete anos a sua colaboração ao C. D. das Aves sem nunca regatear o preço do seu esforço e da sua dedicação, bem merece o apoio moral e material de todos os desportistas da nossa terra”. A festa de homenagem contou com a colaboração da A.D. de Fafe e o Aves ganhou por uma bola a zero. Aos quinze minutos, o jogo foi interrompido para a homenagem ao jogador, que de seguida abandonou o rectângulo de jogo.

4 – O Jornal das Aves, começou a apresentar um palpite do Totobola avisando, com seriedade, que “não somos infalíveis e que, portanto, não se devem seduzir pelo nosso prognóstico”.
Em Santo Tirso ficou registada a realização de festivais com a colaboração de alguns consagrados artistas, com entradas a 25 escudos por pessoa. Um preço exageradíssimo para a época, dizia o correspondente, juntando uma crítica demolidora: quem gastou 70 contos a fazer um quarto de banho num dos recintos também devia ter dinheiro para umas festas populares para a maioria da população de Santo Tirso, que como deviam saber os senhores do Turismo, é de operários fabris.

5 - O Tirsense conseguiu eleger uma direcção, depois de uns meses de crise e desejava-se o seu regresso à segunda nacional. Nessa época, o clube da sede do concelho andava na mó de  cima relativamente ao nosso Desportivo e não se defrontavam directamente. Nos tempos de hoje é o Desportivo que voa mais alto e, como vai haver, dentro de dias, um jogo da Taça de Portugal podemos reviver os antigos “derbys” doutras épocas. Em Setembro de 1962 realizou-se um jogo treino em Santo Tirso e ficou registado um certo contentamento para o Desportivo por ter perdido só por uma bola… Pensarão o mesmo, agora, os que nos virão visitar?
Haverá, certamente, diferenças para menos em número de assistentes de agora, já que existem muitos outros entretimentos e a vida é diferente. Mas os apertos financeiros, esses são os mesmos de sempre: as Finanças decidiram, há 50 anos, estabelecer a lotação do nosso recinto de jogos em “dois mil lugares de peão e duzentos e cinquenta e dois de bancada”, em vez dos quinhentos lugares de peão anteriores e, vai daí, a licença que custava trinta e oito escudos por jogo passou para cento e oitenta. Era “mais um apertozinho ao nó”, da parte das Finanças, na vida dos clubes pobres…


domingo, 28 de outubro de 2012

Há 50 anos foi assim… (O desporto na Vila das Aves, lido na imprensa local)


(Publicado no jornal Entre Margens)

A época desportiva de 1962/63 é o objecto desta rubrica. A seu tempo se verá porquê. A partir da leitura dos jornais locais, preferencialmente do “Jornal das Aves”, procuraremos recordar acontecimentos e retratar ambientes e personagens da nossa história desportiva. Muitos protagonistas e participantes dos acontecimentos relatados na imprensa ainda estão presentes, porque 50 anos não é há tanto tempo assim, e eles poderão relembrar e confirmar o que se descreve.

Agosto e Setembro de 1962

1 –  A electrificação do campo foi o objectivo de uma comissão que parece disposta a desistir, quando já tinha realizado uma soma razoável.
A equipa de ciclismo do clube participou em diversos circuitos (Aldoar, Lousada, Gondomar e outros). No 8º Circuito das Aves (Populares), realizada no final de Agosto, a nossa equipa esteve em destaque: Manuel de Oliveira foi o primeiro (ex-aequo com um atleta do FCP), César Luís o quinto, José Correia o sexto, Noé Ribeiro o sétimo e Noé Azevedo o oitavo. Um elemento da secção de ciclismo (Manuel Ferreira Certo) participou como estafeta na Volta a Portugal em bicicleta.
Os columbófilos da S.C. das Aves encerraram a época com o concurso de Valença do Minho.


No 2ºCircuito de Motorizadas da Vila das Aves predominaram as Sachs e as Kreidler. Os condutores da nossa terra tiveram actuação destacada: o Armando M. Russo (Paredes) obteve o quarto lugar na categoria Sport e o Floriano Moreira o segundo em Especial.
Em Santo Tirso, o 1º Rallye de Donas Elviras levou uma multidão ao Parque a ver os bólidos, atrapalhando a gincana dos velhos carros. O primeiro prémio foi para um Lancia de 1928.
Os pescadores desportivos do “Pic-Nic à beira rio” repetiram o seu concurso de pesca seguido de leilão a favor dos pobres que já vinham realizando há cerca de dez anos. A pouca água não permitiu pesca abundante (7 kgs de peixe) e o vencedor foi Manuel da Silva, seguido de Álvaro de Sousa e de Serafim de F. Gouveia.

2 – O verão foi animado pelo Torneio Popular de Futebol que o Fontainhas ganhou, em despique, na fase final, com o F.C. de Delães, que foi segundo, o Bairro e a Florentina.
Relativamente à equipa de honra do desportivo, a pré-época, como se diz agora, foi agitada pela eventual revisão da suspensão de um ano ao Miranda, aplicada pela direcção cessante e notícia da provável saída do Zé Pereira para o Salgueiros (constando que o Vitória, o Tirsense e o Boavista também estavam interessados no jogador) e do Costa para o Vizela. Foi contratado como treinador-jogador o Dieste, que pelo primeiro treino demonstrou categoria e isenção, porque tanto manda parar as jogadas dos titulares como dos reservistas.
Loureiro, entrevistado pelo Jornal das Aves, lembrou que já levava 17 anos de atleta do clube e nove de capitão, revelou estar com excelente disposição e garantiu que “se todos quisermos, voltamos esta época à primeira divisão”. Trata-se da primeira divisão regional, não façam confusões.
O cronista desportivo do Jornal das Aves, Luís Freitas de seu nome, deixou clara a sua visão do momento: “Onde está o verdadeiro amor à camisola que se veste? Confessamos sinceramente que temos saudades daquela idolatria à camisola rubro-branca do Desportivo das Aves que era apanágio dum Albano, dum Gentil, dum Toninho, dum Ventura, dum Zeca, dum Álvaro, dum Bernardino, dum Pereira Lopes e de outros tantos daquela geração. Agora, ou se joga para se ser ídolo ou apenas com os olhos nos prémios de jogos. E isso é muito pouco.”
Quem quer comentar, cinquenta anos depois?


sábado, 20 de outubro de 2012

Associação Humanitária das Aves

Primeira ambulância e primeira pedra: 23 de Junho de 1979
Registo em super 8 de autoria do sr. António Costa, a partir de cópia digital da Junta de Freguesia.
A cerimónia decorreu no terreno onde está instalado o Centro de Saúde, que havia sido cedido pela Junta de Freguesia para Quartel dos Bombeiros. 
Presentes,para além das pessoas assinaladas com legenda, o Bispo de Portalegre, D. Agostinho de Moura (que residia no Convento da Visitação), o pároco Monsenhor José Ferreira e o Governador Civil do Porto.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O "cerco de S. Sebastião" (2)

Arnaldo Gama também faz referência ao "Cerco de S. Sebastião" em S. Miguel das Aves, em época anterior àquela a que o Padre da Barca se refere.

 No volume  "Só as mulheres sabem amar", 1ª parte de  "Verdades e Ficções" e, mais precisamente na novela "Um defeito de organização", datado de 1852, o autor portuense que também viveu por cá e que situa cá todo o desenrolar da novela, como já referido aqui, põe na boca dum popular a frase: " benho todo cheio de nadoas de binho, e ainda por riba perco o cêrco de Martle e a museca de Riba d'Ave, que bai função rija".
Para explicar de que se trata, o autor escreveu em nota de rodapé:

" Creio que não há aldeia alguma do Minho onde S. Sebastião não seja festejado com missa cantada e procissão, uma vez cada ano. É isto que se chama o cêrco do Martle, que é a procissão do Corpus para o lavrador do Minho. Este costume, tão geral, é resultado da promessa feita por um dos nossos reis, em consequência da peste que assolou o reino. Se bem me recordo, foi D. João III.


Relativamente à vizinha freguesia de Lordelo, cujas tradições e costumes não serão muito diferentes, dizia o respectivo pároco em 1842, respondendo ao Inquérito Paroquial dessa data, que se pode ler na íntegra  aqui:


"Os festejos mais usuais é a Procissão do Cerco de S. Sebastião, que se faz anualmente, e que os povos não afrouxam em semelhante função; a experiência o mostra, porque todos concorrem para ela."


As procissões do Cerco de S. Sebastião foram "proibidas em finais do século XIX. No bem estudado arquivo da freguesia de Beiriz conserva-se a “Provisão Pastoral do Arcebispo de Braga”, datada de 4 de Junho de 1872, interditando estas manifestações invocando que “se tem convertido em occasião de muitas irreverencias, desacatos e peccados, já por que atravessando montes e sitios escabrozos e caminhos defficeis não é possivel guardar-se nellas a decencia e respeito que deve observar-se em todos os actos do culto divino; já porque esfriando a fé e devoção que aconselhou o establecimento destas solemnidades, e augmentada a immoralidade de que tudo abusa, têm-se tornado incentivo para ajuntamentos profanos, nos quaes nem a religião, nem a moral publica são respeitadas” (in Deolinda M. V. Carneiro, As procissões na Póvoa de Varzim 1900 1950, Tese de Mestrado UP, consultada em http://www.memoriamedia.net/bd_docs/transcrioes_Povoa/imagin%E1rio%20religioso.PDF ).

Falta esclarecer porquê "do Martle",  na linguagem popular transcrita por Arnaldo Gama. Na novela, a palavra Martle aparece, noutro contexto, com o significado de Marte, o planeta (" de todos os plainetas que tenho bisto no Lunairo, aquele com que zango mais é o plaineta Martle") .
Mas é muito mais plausível que, no caso, martle seja corruptela de Mártir.
A procissão seria pois o Cêrco de S. Sebastião ou o Cêrco do Mártir (S. Sebastião).


quinta-feira, 18 de outubro de 2012

O "cerco de S. Sebastião" (1)

S. Sebastião existente
na Igreja de Sobrado (Vila das Aves)
Na procissão da festa do padroeiro S. Miguel realizada no dia 30 de Setembro passado, a imagem de S. Sebastião que se venera na Igreja Matriz  "foi a única que não teve a honra de ser levada na nossa procissão."

Tempos houve em que o S. Sebastião tinhas honras de procissão própria e exclusiva. Uma referência a essa procissão é feita pelo Padre da Barca.

"Dantes era costume - e tal costume ainda vigorava em 1880 - fazer-se anualmente o Cerco de S. Sebastião. Tal cerco, que se realizava nos fins da primavera ou no Verão, consistia em levar-se, processionalmente, a imagem de S. Sebastião em redor da freguesia para a abençoar e proteger contra a peste, fome e guerra. A procissão do Cerco saía da Igreja pouco depois do meio dia, para o lado da Barca, e recolhia a ela ao fim da tarde pelo lado da Boavista. Era uma procissão com carácter de penitência. Porque o andor era muito alto e os caminhos apertados e ladeados de denso e copado arvoredo, iam à frente alguns homens empunhando fouces roçadouras para cortar os ramos que estorvassem a sua passagem. Na Casa da Barca, era costume o cortejo religioso entrar pelo portal da Capela e sair pelo que dá para o caminho do Freixieiro, e também era da praxe os donos da propriedade mimosearem os pegadores do andor e os empregados das irmandades com um vintém de trigo e uma malga de vinho, naqueles tempos azal de saltar aos olhos".

Padre Joaquim da Barca, S. Miguel das Aves,  Monografia, 1955, pag.  175.

Mas há outra referência...

sábado, 13 de outubro de 2012

De partida.


Faleceu no dia 7 deste mês de Outubro o Padre Joaquim Azevedo Mendes de Carvalho, capelão do Mosteiro da Visitação.

Natural de Vila das Aves ( 19/7/1930), onde residia, foi ordenado sacerdote em 1953 e foi pároco em Padim da Graça até 1988 e, mais tarde, Vigário Paroquial de Delães e pároco de Bairro. Foi professor de Educação Musical em Braga e na Vila das Aves, tendo exercido cargos directivos nas escolas em que leccionou. Dedicou-se à música desde os tempos do Seminário sendo autor de numerosos cânticos religiosos e tendo tido papel de relevo na preservação e restauro dos órgãos de tubos de muitas igrejas.
Foi fundador e editor de revistas de Música Sacra e regente de vários coros.
Foi candidato à Junta de Freguesia de Vila das Aves em 1993 e em 1997, como cabeça de lista do PSD, tendo exercido o seu mandato na Assembleia de Freguesia com toda a dedicação e humildade. Foi membro da direcção do  Lar da Tranquilidade (Vila das Aves)

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Agrupamento de Escuteiros do CNE - Vila das Aves

Este pequeno filme, do Sr. António Costa, deve ser de 1967 e mostra os escuteiros, lobitos, caminheiros e dirigentes da altura juntamente com o pároco e assistente e antigos escuteiros. Entre eles, um dos fundadores, Luis Gonzaga Mendes de Carvalho.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

S. Miguel e as Aves

Já nos referimos aqui, e anteriormente aqui e noutras entradas relacionadas ao assunto.
O que se transcreve a seguir revela e esclarece algumas subtilezas do discurso paroquial na Vila das Aves, cujo conhecimento é indispensável para interpretar certas posições... 
Estreiteza de vistas, é o que é, como se a balança como símbolo fosse exclusivo de certa iconografia angélica (recorde-se a balança da justiça e a balança do zodíaco!)... Como se a iconografia de S. Miguel fosse exclusivamente a da balança... 
Eclipse total? Terá a tal balança dos tais "Boletins" sido roubada ao santo? E, passada a "romaria", perdeu-se a balança e não mais se encontrou (o  que explicaria que ... o S. Miguel do viaduto sobre o caminho de ferro... não é o padroeiro?).  Então o santo não é um, são dois?... E este é para lutar com quem?

daqui:

"a balança é símbolo distintivo e individualizante do culto ao nosso São Miguel Arcanjo como intercessor para com as benditas Almas do Purgatório, hoje cada vez mais teologicamente referidas como Fiéis Defuntos. Necessariamente recordo que, após o Partido Renovador Democrático (PRD) ter vencido as Eleições Autárquicas de 1985 em Vila das Aves, a estatuária do São Miguel Arcanjo da balança sofreu um eclipse total e, concretamente em Vila das Aves, até foram publicados pelo “Movimento de Independentes” sob a sigla PRD dois Boletins (eu tenho o nº 0 e o nº1 que me foram metidos na caixa do correio) intitulados “A Balança”!"


"Vila das Aves, três de Julho de 2012, primeira terça-feira do mês que por ser o dia litúrgico do Apóstolo São Tomé, me faz escrever o que já disse e volto a lembrar: o São Miguel junto ao viaduto sobre o caminho de ferro não é o Padroeiro de Vila das Aves, mas sim o São Miguel encontrado na Net para lutar com São Tomé…"
"Padre Fernando de Azevedo Abreu."

S. Miguel ... o outro... (o guerreiro onde descansam as pombas da paz...)

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(11)

O Padre António escrevia em 20 de Outubro de 1930:
Empresa Industrial de Negrelos, na margem direita do Vizela..(1955?)

                O sr. F. Machado Guimarães, pessoa de destaque e morador na freguesia do Ave, mandou gravar na Fábrica, que agora lhe pertence, estas palavras: “Fábrica ou Empreza Industrial de Negrelos”.
                Numa reunião em que este cavalheiro estava falando, junto à ponte de Negrelos, voltado para S. Miguel do Ave, ou das Aves, disse ao sr. Capitão Bacelar e a dois indivíduos de distinção, estando eu presente – Esta região de Negrelos é muito importante. Depois explicou da seguinte forma: temos ali a farmácia do sr. Aires e lá no alto mais duas e um médico, ali no fundo a grande Fábrica de Negrelos, e um notário privativo dessa importante freguesia de Negrelos, a Fábrica do Sr. Moreira, a Fábrica de fazer papel, a minha Fábrica, a Fábrica dos pentes, etc.
                Ora, se este grande industrial assim falava, é porque tinha a consciência de que dizia bem e não não enganava pessoas de elevada posição social, que vieram ali tratar de um melhoramento de vulto na Telégrafo Postal. Foi Administrador do concelho de Santo Tirso, é actual Camarista e da “Comissão pro-Aves”, portanto o depoimento dele tem grande valor, e confirma a minha asserção de que esta região tem o nome de Negrelos; e achava bonito e bem e apropriado, na sua Fábrica, o nome glorioso e nobre de Negrelos. Na sua Fábrica não quer Aves, nem galinhaço. Ali há ordem, respeito e limpeza.
                Além de tudo, que fica dito, vem em abono da minha proposição a existência, em S.  Martinho do Campo, da ponte românica de Negrelos, e em Roriz a capela da (…)
                (…) Quando rezar peça a Deus por mim, para que de guerreiro me torne santo, como o D. Nuno, e me dê paciência para aturar as suas chicanices de ataque bisonho e inferior, cujo efeito  psicológico no povo ilustrado é contraproducente ao que o colega julga obter.
                (…) Todos os habitantes da freguesia do Ave, em todas as eras, respeitaram sempre o nome de Negrelos, que tem pergaminhos próprios. Não pode ser fidalgo um simples servo de gente d’algo.
                Ora a freguesia das Aves já foi súbdita, e criada, dependente de Barcelos e de Famalicão (os nobres), portanto não pode ser superior aos nobres e fidalgos de quem esteve dependente, e torna a estar dependente de outrem.
Agora depende de Negrelos e de Santo Tirso.
                O santo da inconfundível, nobre e fidalga vila já desconfia da sua súbdita e afilhada do Ave, e não admira, porque todos sabem que é de origem bárbara, e foi despedida à francesa pelos nobres Barcelos e Famalicão.
                Quem é assim despedido, é sinal de ser fraca criatura, e o Santo Tirso austero e um tantito desconfiado  vigia a sua criada Aves , porque, além de mais defeitos, é vaidosa em demasia, não obstante ser pobre.
                (…) Já que estamos em maré de mudança de nomes, melhor será, para castigo de S. Miguel, crismá-lo, mudando-lhe o nome para Santo Antoninho do Ave.
Com o é taumaturgo português e não estrangeiro, pedindo-lhe com devoção, perseverança  confiança, é capaz de fazer nascer  outro Rio Ave no cume de Sobrado e deslizando pelo meio através da sua freguesia e Romão até Caniços, ficava com dois autênticos verdadeiros Aves, e então e só então poderia dizer com verdade e propriedade  que a sua freguesia era dos dois Aves, e de seca esquelética passava a ser fertilíssima, de contrário não diga barbaridades e inexactidões, que é capaz de enganar o digníssimo Abade de Burgães, que nem gracejando mente, e não conhecendo as duas freguesias, pelas suas descrições fica supondo que a sua é uma cidade, e a de Negrelos, que é uma aldeia de Paio Pires ou a ilha do Diabo.
                Diga a essas mulheres de asas aveludadas e macias que deitem muitas flores na Ponte de Negrelos, porquanto  todo o ano lá passam para levar a água de Negrelos em milhares de cântaros, para dessedentar esse povo que periga de sede , e se parasse a Fábrica morria de fome.
Au revoir.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Para se sentir como a alteração de um muro cria uma sensação de largueza e liberdade, nada como comparar fotos mais de 20 anos de diferença...

terça-feira, 24 de julho de 2012


 Assinalando a inauguração do Parque do Amieiro Galego.
Vontade do Povo

No Amieiro Galego, quando, para navegar, era primeiro necessário construir a canoa...

quarta-feira, 18 de julho de 2012

O Amieiro Galego e a "vontade do povo".

O Amieiro Galego (a fonte termal e o local) é, para o povo de Vila das Aves, tão importante que as transformações que serão inauguradas no fim de semana vão, seguramente, marcar uma época e as pessoas guardarão com carinho as imagens que vão registar de todos os modos possíveis.
Como prova da permanência da ideia do Amieiro Galego na ideia do povo e como homenagem a um avense que pelo seu bairrismo merece ser recordado, publico hoje um desenho que me foi pessoalmente oferecido pelo autor há mais de 25 anos. Trata-se do sr. Narciso Marques, mais conhecido por Cisinho Marques, que faleceu em 2 de Maio passado com 78 anos e que, como avense, viveu intensamente a nossa história de Vila.
Pois vejam como surge, tantos anos depois, o parque idealizado pelo Cisinho Marques ! Podemos bem pensar que já era a voz do povo, pela pena do Cisinho Marques a indicar o que fazer!

Amieiro Galego: inauguração do parque.

Programa:

sábado, 7 de julho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(10)


Em 23 de Outubro de 1930, a propósito da inauguração do Mercado de S. Miguel das Aves, na primeira página do Jornal de Santo Tirso, escrevia o Padre Joaquim:


Nunca em nenhum momento da minha vida desejei tanto possuir uma pena de ouro como hoje.
Tal anelo, nesta hora, abrasa a minha alma inteira. Quem ma dera ter para honrar S. Miguel de Entre Ambas as Aves e este jornal amicíssimo na consagração que com esta página lhe presta, num requinte de amabilidade e gentileza.
Eu tenho à minha freguesia um amor sem limites(…). Nutro por ela uma paixão ardentíssima(…). Vê-la resplandecer  como o astro mais rutilante seria a minha suprema ventura.(…)
Nem sempre se chamou, como agora S. Miguel das Aves ou simplesmente Aves. Durante muitos anos, melhor dizendo, durante muitos séculos, denominou-se S. Miguel de Entre Ambas as Aves ou de Entre Ambos os Aves, como documentos o atestam e estudiosos o sabem(…)
Em razão de se achar colocado entre as duas ribeiras chamaram-lhe assim para a distinguir de outras freguesias ou paróquias banhadas por uma delas como Riba d’Ave, Santo Tirso de Riba d’Ave e Refojos de Riba d’Ave e Santo Adrião de Vizela, etc (…)
S. Miguel das Aves, com o seu desenvolvimento, absorveu por completo duas freguesias pequenas mas galhardas, S. Lourenço de Romão e Santo André de Sobrado, de cuja existência nos falam as pequeninas igrejas em ruínas solitárias e melancólicas. Todas três constituem actualmente um magnífico bloco homogéneo, que a cordialidade e o perpassar dos séculos tem de tal sorte caldeado que não será mais possível arrancá-las dos braços uma das outras.(…)

terça-feira, 3 de julho de 2012


Haiku do Amieiro

Na sombra do amieiro
Um açude de prata
Oh doce murmúreo...

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(9)


(datada de 5/10/930, continuando do número anterior, a correspondência do Padre António)

 O Telégrafo - Postal de Negrelos ... em S. Miguel das Aves
                Com esta breve descrição parece-me estar a ver a Bruxa, “que a vivos medo e a mortos faz espanto”, de espada desembainhada a comandar as Aves  de mistura com muita bicharia, e ouvir o zumbido dos insectos, o piar dos mochos, o grasnar dos corvos, o regougar das raposas, os uivos dos lobos e o sibilar dos ventos; o latir dos cães, o chilrear dos pardais, o assobiar dos melros, o tagarelar das pegas e o trinar dos rouxinóis e canários; o arfar surdo e cadenciado dos perús, o cacarejar das galinhas, o cantar dos galos e perdizes e finalmente os guinchos estrepitosos e monótonos dos pavões!
                Feita esta digressão voltemos a focar os rios e as Aves de S. Miguel. Da confluência ou junção do rio Ave com o Vizela, em Caniços, é que resultou o Avizela – Ave vizela – e como de Caniços para baixo segue um só rio formado pelos dois Ave-Vizela, o suposto maiorzinho, Ave, empalmou o Vizela, e meteu-o na barriga, ficando a chamar-se Ave e só Ave, que todo lépido e orgulhoso se estende atá Vila do Conde.
                Sumiu-se ou fundiu-se o Vizela com o Ave, em Caniços, e portanto não se formou o santíssima léria do Avezinho, Ave pequenino, mas o Ave maior. Percebeu?
Isto é de instrução primária elementar. Com propriedade e verdade devia chamar-se: Ave-Vizela, ou Avizela, ou Avesão, ou Ave maior, ou simplesmente Ave, como realmente se ficou a chamar.
                (…) Se for preciso escopeta e chumbo também sei atirar para a cabeça das Aves. É uma necessidade dizimá-las, pois já não cabem em todas as casas da sua freguesia. É por isso que querem a Estação de Negrelos, a Telégrafo-Postal de Negrelos, três quartas partes da Fábrica de Negrelos, a Fábrica ou Empresa Industrial de Negrelos, a Mercantil de Negrelos, a Loja Operária de Negrelos, a Fotografia das Aves de Negrelos, bilhetes da rifa para a Igreja das Aves de Negrelos, metade das pontes de Negrelos, a capela da Senhora da Seca de Lordelo, a Fabrica Bermoser de Lordelo, e por este andar chegam à própria Igreja de Lordelo, onde estabelecem a “garage” e nos velhos automóveis que aí há vão à conquista do mundo inteiro.
(… )  O colega em dois artigos faz-me alusão pessoal , transcrevendo só palavras isoladas e escarnecendo de mim , à moda das mulheres de soalheiro.
                Se o colega se limitasse no último e penúltimo números deste jornal a fazer a descrição chulista da sua e da minha freguesia, que deixou os papalvos de boca aberta, eu ria-me da sua manhosa, intencional e contraditória palinódia, e deixava passar carros e carretas, almocreves e ferradores, tocadores de viola, criados de servir, padres e operários, azêmolas e cachorros, gatos e cães de regaço, formigas, mosquitos, carregadeiras de pão, moleiros e taberneiros, jornalistas, estudantes, mendigos, a caliça e aleijões que por aí há e finalmente rapazes e raparigas que nessa freguesia andam amiúde com os baldes na mão a tirar água dos poços e cisternas para matar a sede a essa gente, que, em Romão, já tinha morrido toda se não fosse um benemérito brasileiro;  mas vindo fazer confronto com outras freguesias, inclusive a de Negrelos, quando terminar o assunto – Estação de Negrelos ou das Aves – farei um paralelo entre a sua e a minha freguesia  e verá qual é a mais importante.
                Far-lhe-ei ver que se a sua é pérola ou princesa na aparência, a de Negrelos em tudo e por tudo é rainha.
                Tem essa freguesia a vantagem da bela situação geográfica e o bairrismo desse bom povo, de que  Vª. Revª é o mentor entusiasta.
(…)
                Senão veja o que era a sua freguesia, composta de Romão, Sobrado e Aves, três velhos cacos soldados a resina, para fazer um triângulo maçónico com vértice em Caniços – o inferno!
(….) chega à conclusão que Negrelos é uma ladeira íngreme, sobranceira às Aves, onde há muita humidade, conforme o  colega confessa no último número. Sendo assim, Negrelos está vertendo para as Aves todas as suas águas, o que será transformar a sua freguesia  num escoadouro pouco limpo… A tanto não queria eu chegar.
(…) Por hoje basta, que o relógio dá duas horas da noite.
Au revoir.
Padre António Maria Monteiro Brandão

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(8)

Caniços, (o inferno?) em 1909 

( O Padre António, em Setembro de 1930...)


     Que era ridículo e irrisório já lhe fiz ver, que é despropositado e falso, fácil é demonstrá-lo, sem recorrer à filosofia jocosiana. Para que fosse apropriado era mister que o Rio Ave, de quem a sua freguesia parece herdar, embora impropriamente o onomástico Aves passasse mais perto da Estação que Rio Vizela, mas é o contrário.(…) Portanto devia chamar-se estação do Rio Vizela, a indicar que este rio passava perto, e não estação do Rio Ave, que está longe e muito menos das Aves, a não ser que este nome derive de passarada.
     Transformar-se de Rio Ave em fêmeas Aves ou confundir-se, o meu amigo não quer por recomendação expressa de última vontade , antes de lhe arrefecer o céu da boca. Além disso
        A transformação por metempsicose do Ave, rio,  em aladas bicharocas Aves, é um disparate, um verdadeiro contra-senso, uma falsidade!
        Deveria neste caso chamar-se freguesia e estação do Ave, e não das Aves, como bem fizeram os habitantes de Riba d’Ave, de Santo Tirso de Riba d’Ave (…), e os de sobre o Tâmega, etc. que não usaram o plural, mas o singular.
        É uma falsidade, é um erro, dizer que um é ao mesmo tempo dois, e portanto, acertadamente andaram estes povos cultos e civilizados em usar o onomástico Ave e Tâmega e não Aves e Tâmegas, etc.
        Das duas uma, não há que fugir, ou os antepassados da sua freguesia puseram ou deram o nome de Aves por causa da passarada, ou então temos forçosamente de concluir que eram estúpidos e bárbaros; e ainda existem na sua freguesia alguns bárbaros, e é o colega  que o afirma em letra redonda, no último número deste belo jornal!
        De tudo isto se vê claramente que há corrupção e transformação de palavras e de sexo e, portanto, o nome de Aves é despropositado, impróprio e falso. Ora isto implica a existência dum nome próprio e verdadeiro, e este é Negrelos . Por conseguinte, não deve jamais chamar-se das Aves, mas Estação de Negrelos. Ademais as Aves, como seres viventes, morrem, statutum est semet mori, depois de mortas corrompem-se, e conseguintemente cheiram mal, jam fetet; ao que mal cheira chama-se porcaria, que nem toda a água do rio Vizela, com muito sabão de mistura, é capaz de lavar.
        O colega varias vezes afirma, e uma vez tentou infantilmente demonstrar que a sua freguesia tirou o nome dos dois Aves. Qual Aves? Ou qual carapuça? Nunca se chamaram Aves aos dois rios  até Caniços, nem tão pouco daqui a Vila do Conde.
         (…) O rio Vizela com propriedade filológica ou científica jamais teve o nome de Avezinho, rio pequenino. Onde estava o rio grande para termo de comparação? Avizela, rio pequenino, companheiro e amigo inseparável do Ave, rio grande! (…)
         O meu amigo e colega padre Lemos a respeito da ciências filológica está muito atrasado, não pesca patavina, e não admira, porque os seus dicionários estão errados neste ponto ou são a sucata da biblioteca da Bruxa ou Moura Encantada de Valgas, com morada antiquíssima nessa freguesia. Decomponha como quiser, e dê-lhe a etimologia mais arguta que entender que com propriedade científica não consegue do Vizela fazer Avizela, rio mais pequeno (…)
         Na bruma dos séculos, até há cinquenta anos os habitantes de S. Tomé de Negrelos e de Rebordões, e toda a gente dizia que o lugar de Caniços era o inferno, e apontando para a minúscula e antiquíssima freguesia de Romão e para toda a parte sul de S. Miguel, a que foi anexa, chamavam  a África, e bem o parecia.
        O colega não o pode negar e sabe perfeitamente que ainda aí existem exemplares autênticos de bárbaros e vestígios dos romanos e dos mouros…
          Era realmente feio o caco velho de Romão e toda a parte sul das Aves, que desde Romão abrangia o covil da Bruxa de Valgas e a aldeola do Tiromiro e seus vizinhos Salsa e Capela; estendendo-se pelo  lado de baixo da Botica Velha abrangia o moinho do Ruivo e tinha como terminus a casa em que nasceu o antigo Saia, mais tarde benemérito Conde de S. Bento.
(continua)

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(7)


( o Padre Joaquim da Barca:)

… confesso, com sinceridade, que me tem tristemente impressionado a prosa romarieira do meu grande amigo o sr. padre António de Xisto, na controvérsia que originou , sem nenhum motivo ponderoso, com a sua cartinha de 17-8-930, inserta no nº 18 deste amicíssimo jornalzinho, e que tenho lamentado, muitas vezes, a sós comigo, a pobreza franciscana da sua argumentação.
Casa da Barca, Vila das Aves
                Não tenho sentido pequeno pesar em ver o seu nome a subscrever artigos em estilo de esfolhada, capazes de despertar riso em ignorantes, mas absolutamente impotentes para convencer uma inteligência, mesmo modestamente esclarecida.
                Um assunto sério, meu caro senhor, trata-se em linguagem séria e com argumentos sérios.
                As facécias, os motejos, as chacotas, as zombarias e os remoques são geralmente, contraproducentes. (…) Deixe-me falar-lhe, sr. padre Brandão, com o coração nas mãos: eu esperava mais e melhor da sua pena. Não me tome a mal esta rude franqueza.
                (…) Se não vier coisa de maior tomo, desde já posso cantar vitória, não lhe valendo de nada ter chamado à baila o D. Quixote – a imortal criação de Cervantes,  infalível recurso de todos os arsenais mal apetrechados  para as refertas do espírito, já mais poída que as botas de um almocreve. Nem originalidade, nem novidade, nem sequer ajustada aplicação.
                E depois também não foi nenhuma a sua  ventura na escolha do matiz para os seus artiguinhos ou artigões…
                Ora veja lá, sr. padre António Maria Monteiro Brandão, se são digno esmalte da sua prosa as palavras: taberna, meios litros, ramos de loureiro , paus de ferro, cacetes, machos – e de penas –fêmeas, galinheiros e galinhas, capoeiras e galos, bicharocos, bacamartes, saias curtas, cambaleando, turras, manhoso, gaiolas e outras miudezas.
                (… )  E como se há-de classificar a ousadia de chamar ridículo ao nome Aves, só porque se lembrou de disparatadamente o comparar a galos e galinhas ou disso o derivar?
                (…)  E que se há de dizer da afirmação piramidal de deixar de ser nossa a estação, pelo facto do terreno em que se encontra ser comprado pela Companhia?
                É claro que ela é de todo o mundo para uso, mas enquanto à localização é só nossa, é só das Aves, meu reverendíssimo e diletíssimo confrade, nunca podendo dizer os de Negrelos, com verdade, que a sua freguesia tem estação dentro dos limites.
                 Quem precisa de fazer uma nova estação não é S. Miguel das Aves, que já tem uma –e ainda há de ter outra, se Deus quiser; quem carece de edificar uma, ao  menos, é S. Tomé de Negrelos, que não tem nenhuma, nem de cortiça nem de papelão.
                (…) Também há de permitir que eu  mais uma vez  lhe diga que do meio das pontes que nos unem, para a banda de cá, mandamos nós e só nós.
                Fique isto sabido duma vez para sempre. Intrusões, nunca!
                (…) E o sr. padre Brandão, meu amigo íntimo, de muitos anos, querendo, no que me dá muita satisfação, convidar-me para as afamadas sarrabulhadas do solar rico de Quintão, escreva para este seu criado, que na Barca, que já se desencalhou do Vizela e que põe ao seu dispor, para um passeio até ao Fojo, aguarda as suas estimadas ordens, prometendo jejuar na véspera das jantaradas, para gáudio da  cozinheira  e do patrão. Ah, meu boníssimo reverendo, se tivesse lido com serenidade e sem pruridos de literato filósofo os meus artiguitos sobre a palavra “Negrelos”, daqui das Aves, não se teria arvorado em D. Magriço da sua terra, cuja honra ninguém poluiu nem seque tentou poluir.

sábado, 9 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(6)


Aves, 23/9/1930
O que as Aves são…

" o murmurante Ave fez-se seu padrinho..."
         As minhas dilectíssimas Aves valorizam-se de dia para dia e de dia para dia é mais intensa e vibrante a sua ânsia de progresso (…). Querem vencer e hão-de vencer.(…)
         O seu nome – “Aves” – para quem lhe sabe a origem e for susceptível  de se impressionar pelo belo, vale um poema e não há chocarrices e graçolas que consigam diminuir-lha a valia, roubar-lhe os ânimos, ofuscar-lhe a poesia. Ali, ao norte, temos Riba d’Ave, rica e formosa; mais para o sul, Santo Tirso de Riba d’Ave, primeiro, a vila donairosa, inconfundível; e, depois, num vale formosíssimo, onde as vinhas e os laranjais reverdejam pomposamente, aninha-se, num grande tabuleiro alfombrado de relvas, Refojos de Riba d’Ave.
           O murmurante Ave, ao beijar essas terras na sua passagem para o mar, fez-se seu padrinho. E que lindas e esbeltas afilhadas escolheu e que magníficos enxovais lhes ofertou.
        Para com S. Miguel levou mais longe ainda a gentileza: foi dela também padrinho e arranjou-lhe uma madrinha de peregrina formosura:
         O Avicela, o seu melhor tributário! E a esta afilhadinha, para se não confundir com nenhuma das outras, resolveram os dois, de comum acordo, dar-lhe um nome que traduzisse os encantos de ambos e que a todos lembrasse, através dos tempos, a frescura dos salgueirais que os orlam, o suavíssimo murmúrio das suas linfas ao deslizar pelas pedras dos açudes e ao amor do primeiro abraço que lhe deram.
           E escreveram-lhe na fronte nobre e bela. S. Miguel “ De Entre os Aves”.
           (…) E em todo o Portugal só o fará derivar de passarada quem não pescar patavina de onomatologia.
           (…) Vai na vanguarda. E tem tudo isto sem dever nada às seis paróquias que a cercam, às quais pode dar, e dá de facto, lições de actividade, abnegação e bairrismo.
           As minhas Aves queridas têm hoje uma aspiração muito legítima. Com tudo o que acima mencionei, com as águas do Amieiro Galego  e com a iluminação eléctrica, querem ascender à categoria de vila! E porque não?  Não as há por esse Portugal fora muito mais atrasadas e pobrezinhas? Eu creio que ainda hei de ter o gosto de ver nas geografias, na relação delas, a Vila das Aves, ainda que isso pese a uns invejozinhos que em seu redor medram e que ainda a hão de saudar com respeito, venerar com afecto  e reconhecer como terra de brios grandes(…).

          Padre Joaquim de Barca

domingo, 3 de junho de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(5)


(a prosa do Padre António, continuação…)


Já que entrei nos domínios da filosofia, apesar de não ter a elegância demosténica, filosoficamente lhe vou demonstrar que se na Estação se inscrevesse a palavra Aves o colega seria o primeiro a arrepender-se e não haveria chefe que fizesse o serviço.
Para isso vou estabelecer as premissas. A primeira será tirada da filosofia Tomista, e o restante da filosofia Jocosiana.  Jocoso, como  sabe, é um filósofo de fama mundial. A sua monumental filosofia entra em todas as Universidades científicas. Nas Academias, Liceus, Colégios e Seminários é muito manuseada.(…)
Se na estação se eliminasse a palavra Negrelos e fosse substituída pelo irrisório Aves, a rapaziada, lendo este nome, munia-se de fisgas e logo que visse o Chefe à janela com os vivos amarelos no barrete, supondo que era um canário ou um papa-figos  – zás – uma fisgadela  na testa do chefe, e ficava morto. E caso não morresse e estonteado fugisse , a rapaziada subia à janela para caçar o passarinho; entrava e era presa pela autoridade, como bando de gatunos e assassinos.
Em visto do exposto não havia chefe que quisesse fazer os serviço, a não ser um descrente ou um louco, mas isso não convinha e, portanto, o colega Padre Lemos dizia: “ mude-se outra vez o nome, Negrelos é que deve ser e não Aves”.
Tornava a estação a chamar-se de Negrelos e não das Aves: damos de barato que o amigo Padre Lemos não se dava por vencido com este argumento autenticamente Jocosiano.
Se esta demonstração o não convence, como nos há de convencer  a sua reles demonstração de que Negrelos vem de ager  e de niger?
Negrelos decomposto não descende de tais bicharocos  nem de ager  e niger. Isso é uma invenção sua ou de algum nefelibata, muito inferior à minha Jocosiana, que é mais provativa; e não repugna acontecer o que por sua argumentação se pretende demonstrar.
Niger e ager são Aves glicónicas que não arribam a Negrelos, e alimentam-se nos arrozais da sua fértil e mimosíssima freguesia.
(…)  O amigo Padre Lemos ao ver a palavra Negrelos na estação fica desnorteado, arrepiam-se-lhe os cabelos, crispam-se-lhe as mãos  e com os nervos em contínua vibração, puxa do florete e investe contra o seu inimigo Negrelos, como o camponês contra os paus de ferro e o D. Quixote contra o moinho de vento.
O seu amor apaixonado pelas Aves queridas ofusca-lhe o espírito e faz-lhe ver preto o que é branco e bonito o que é feio. (….) o amor é um binóculo prismático que deforma a verdade.
É por isso q eu num artigo o meu amigo escreve : o Negrelos da minha embirra é o das estações férrea e do telégrafo postal; noutra parte finge não saber o que Negrelos é e noutro artigo dá-lhe personalidade jurídica responsável, porquanto chama-lhe usurpador, e ser preciso bani-lo e fazê-lo passar o Avizela. Apelida-o de feio e estrangeiro , e noutro eleva a adjectivação ao superlativo, e denomina-o de estrangeiríssimo. Para fundamentar a sua proposição argumenta: que não nasceu nas Aves, nem está registado no civil nem no religioso.
O meu amigo falta à verdae duas vezes só neste período; porquanto nasceu aí na estação que
Impropriamente pretende cognominar das Aves e está registado oficialmente como passo a demonstrar.
O Negrelos a que se refere não é estrangeiro porque nasceu na estação apenas ela chegou à idade e hora própria de ser mãe, viveu sempre em sua companhia, foi baptizada por quem de direito  e, agora que tem maior idade e fez as bodas de ouro, jamais a largará.
Além disso não é estrangeiro porque só se chama e é estrangeiro  o território, idioma, pessoas ou coisas de Pátria diversa.
Ora Negrelos é do nosso pátrio Minho, da nossa linda e poética região(…)
Está registado oficialmente nos livros do chefe da Estação e em muitos cartões, cartazes e anuários ferroviários.(…)
Mudar o nome nesta altura seria um disparate incompreensível, um verdadeiro absurdo e faria um transtorno enorme. Isto é tão intuitivo que não carece de demonstração.
Se os das Aves querem uma Estação com o nome da sua freguesia que façam uma nova em terreno que lhe pertença  e não no terreno que agora não é seu, porque o venderam
à Sociedade Soares Veloso em Comandita. A estação que aí está é tanto sua como minha, pertence tanto às Aves como aos de Negrelos, Rebordões, Roriz, Monte Córdova, etc  (…)
Os de S. Tomé não reconhecem aos de S. Miguel o direito de lhe imporem o nome despropositado de Aves e gloriam-se de ver e ler na estação o histórico e fidalgo – Negrelos.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(4)

( e continua, o padre Joaquim…)

“se as mirasse com as suas boas lentes de aros de ouro, descobriria, através da bruma dos séculos, que o mimosíssimo triângulo que tem o vértice nos Caniços e a base em Lordelo e Riba d’Ave, foi sempre mais florescente e povoado que a sua paróquia, chegando a comportar três freguesias, todas de antiquíssima formação .(…)
As Aves o que são devem-no à sua excelente situação geográfica, às maravilhosas condições da sua topografia, ao bairrismo dos seus moradores e à generosidade de alguns dos seus filhos. Não querem a freguesia de S. Tomé de Negrelos para mãe, quanto mais para pai!...(…)

E também não estão resolvidas a consentirem que se confunda o seu  belíssimo nome “Aves” com “Negrelos” que não lhes pertence, nem reconhecem a ninguém o direito de lho querer impor. As quatro letras da palavra “Aves”, para mim e para todos os meus conterrâneos, valem mais e dizem muito mais que as oito – e dantes eram nove!- de Negrelos.


Resposta do Padre António…

Negrelos,  14-9-930

Lendo no último número do “Jornal de Santo Thyrso” a correspondência das Aves, veio-me à lembrança o camponês que embirrava com os paus de ferro e o Dom Quixote, que supunha ver num moinho de vento um inimigo temível a esgrimir lanças; e notei que o amigo Padre Lemos foi duma infelicidade pasmosa ao pretender dolosamente dissecar e refutar a minha prosa plumitiva, testa, brava e indignada!... (…)
Foi preciso esperar mais de 20 anos para ver,
ainda que efemeramente, o nome Aves
na estação...
Eu e os meus patrícios não confundiremos o sexo macho com o sexo fêmea. Ficamos sabendo que as fêmeas Aves , por si protegidas, têm quatro penas e o macho Negrelos tem oito e que antigamente tinha nove, mas que lhe foi cortada uma.
Negrelos está aqui de cima com vida e saúde, as Aves ficam-lhe aos pés. A linha férrea e o rio separam o macho das fêmeas, não se misturam. Morra descansado e em paz.
V. Reverência tem a estuar-lhe no peito três amores: o amor da religião, que professa exemplarmente, o amor da família, que idolatra, e o amor das peregrinas e queridas Aves, que o entusiasma e apaixona.
É  seu sonho dourado engrandecê-las com bons caminhos e estradas, casas bem construídas e alinhadas e que tenham inscrita a ouro, como brasão fidalgo, a palavra Aves.
Eu preferia mandar pintar uma Ave em cada casa. Ficava a matar esse símbolo onomástico. Nomes são nomes, não enchem barriga, ao passo que as Aves  parecem as naturais que, preparadas com arroz, fazem um pratinho muito apreciado.
É mais estético e afidalgado pintar uma Ave , e é de mau gosto e até ridículo escrever a palavra Aves na frontaria das casas.
Quem passar de viagem no comboio, vendo escrita na Estação a palavra Aves, diz logo: “ ali está uma gaiola”; e como Aves é um termo genérico, podem fazer ideia que é um galinheiro que contem galos e galinhas para despachar . Reparando que todas as casas ostentam o mesmo onomástico Aves concluem logicamente: aqui é a terra das galinhas e dos galos, porque existem muitas capoeiras;  como corolário flui naturalmente que não se deve escrever a palavra Aves na estação de Negrelos nem em casa de rico ou de pobre, de contrário fica a freguesia de S. Miguel das Aves a ser conhecida por freguesia das capoeiras
Se a lógica não é uma batata, fica provado filosoficamente que se deve conservar o nome de Negrelos na estação  e não o trocar pelo ridículo Aves.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Aves – Negrelos: um despique jornalístico entre amigos, em 1930.(3)

" O sr. padre António, do seu solar de Quintão, olhou para o passado
das minhas peregrinas Aves sem óculos..."

(ainda o Padre da Barca, em 8-9-1930)

“… O próprio mafarrico não se lembrava disto! …. Depois chama-lhe carcaça seca, mirrada, esquelética e sem vida. Em primores ninguém o vence, meu caro amigo, nem em fantasias!
E mais abaixo dá-lhe uma cabeça com bico, garras e asas e acaba por lhe chamar Ave medonha! Isto é que é usar termos polidos, sem falar na sua impropriedade, pois a minha freguesia não tira o nome que orgulhosamente usa de nenhuma espécie de animais alados, mas dos dois rios murmurantes que a cingem com a sua linfa e cuja frescura e poesia admiravelmente traduz!...
(…) Se S. Tomé tem caminhado tão vagarosamente; se não tem tido energias para se engrandecer a si própria, como poderia ser capaz de transformar as Aves na princesa do concelho?
(…) Ao antigo “Julgado de Negrelos”, do qual a sua terra se orgulha de ter sido a sede, com o que nada temos, nenhum bem nos veio e nunca lhe pertencemos.
A sua influência, infelizmente bem restrita, jamais conseguiu fazer-se sentir do lado de cá do Ave que nos banha pelo nascente, o Avicela, o Avesinho.
Aqui mandou primeiro Barcelos e depois Famalicão. A nossa ascendência é bem mais distinta e fidalga. E note o sr. Padre António que os famalicenses  já nesse tempo davam  a esta minha terra o qualificativo de “pérola” do seu concelho. É evidente que à “Fábrica de Fiação e Tecidos do Rio Vizela” alguns favores devemos. Mas ela não foi fundada por S. Tomé de Negrelos. Os capitais de tal empresa eram estranhos a ela. O ser aí fundada foi uma questão de sorte. Nada mais. E ela, para atingir o esplendor e a importância que hoje tem –o que não pouco tem contribuído para o progresso de S. Tomé – teve de procurar as Aves que lhe forneciam mais vantagem na largueza do terreno e na proximidade do caminho de ferro. Se não mudasse de freguesia, não valeria um terço do que hoje vale e S. Tomé pouco mais adiantada estaria que no tempo dos fidalgos de Vilela ou do Paço.
O sr. padre António, do seu solar de Quintão, olhou para o passado das minhas peregrinas Aves sem óculos. E depois a miopia não o deixou ver nada.”